sábado, 11 de junho de 2011

TJ-RS entende que Município tem de indenizar pela morte de servidora que pegou carona ao se deslocar por necessidade de serviço

Des. Rel. Paulo Roberto Lessa
Parentes de servidor vítima de trânsito têm o direito de receber indenização do município, desde que se prove que o funcionário se deslocava por necessidade de serviço, não importando se o veículo acidentado era da prefeitura ou de terceiro. Com este entendimento, a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul negou recurso do município de Caxias do Sul (RS), condenado em primeira instância a indenizar os dois filhos de uma servidora que morreu enquanto se dirigia para a coleta de exames laboratoriais.
Conforme acórdão, a mãe dos autores da ação era servidora pública de Caxias do Sul, na Serra gaúcha, e exercia a função de técnica de enfermagem junto à rede pública de saúde. Chamada a coletar material para análise na Unidade Básica de Saúde (UBS) de Vila Seca, localizada na zona rural e de difícil acesso, a técnica pegou carona no carro da médica de um laboratório, que prestava serviços na unidade. No trajeto de ida, por volta das 7h50min, o Santana da médica colidiu com uma camionete. Neste acidente, ocorrido na RST-453, seis pessoas ficaram feridas – e a técnica veio a falecer.
Os dois filhos da servidora, por meio de seus procuradores, ingressaram em juízo, pedindo indenização a título de danos morais pelo acidente que a vitimou. Como os autos do processo comprovaram o dano e o nexo de causalidade, já que o município não forneceu o transporte necessário ao desempenho da atividade, restou evidente a obrigação de indenizar. 
O juiz Franklin de Oliveira Netto condenou a municipalidade ao pagamento de 200 salários mínimos a cada um deles. O julgador entendeu que a culpa do município residiu, especificamente, na circunstância de não ter proporcionado transporte à funcionária até o local indicado para buscar os exames.
Inconformada com a derrota na primeira instância, a prefeitura recorreu ao Tribunal de Justiça. Entre outras razões, alegou que a médica que deu carona não conduzia veículo oficial e nem dirigia a serviço do município. Argumentou que, se o município estivesse promovendo o transporte da servidora falecida, com veículo próprio ou mediante fretamento, até poderia se cogitar a responsabilização. Porém, alegou, ocorreu a “mera eleição” da vítima por um veículo particular, que não tinha nenhuma relação com o ente municipal. Assim, defendeu a inexistência de nexo causal entre o fato ocorrido e qualquer ato praticado pelo município, devendo ser julgada improcedente a ação.
O relator do recurso, desembargador Paulo Roberto Lessa Franz, disse que a apelação não merecia prosperar. Para evitar redundância, citou excertos do parecer da procuradora de Justiça Maria de Fátima Dias Ávila, usando-os como parte das razões de decidir:
‘‘Diante da necessidade e da urgência, a vítima viu-se obrigada a deslocar-se com o veículo do laboratório que, como terceirizado, era o responsável pela execução das análises no material coletado no posto, o qual era conduzido pela médica preposta da entidade. Note-se, dessa forma, que o motivo do deslocamento foi a execução do serviço público, ainda que realizado a cargo do laboratório terceirizado, para a realização dos exames nos pacientes atendidos naquela Unidade de Saúde.’’
Conforme a procuradora, a omissão do poder público levou ao que se pode chamar de acidente in itinere (durante o itinerário). Analisando o mérito, explicou que, nos termos do disposto no artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição, o trabalhador acidentado tem direito - além do seguro e vantagens do sistema previdenciário - à indenização civil decorrente dos danos do infortúnio, pelos quais responde o empregador, quando incorrer em dolo ou culpa. Por sua vez, são pressupostos da obrigação de indenizar a ação ou omissão do agente, culpa, nexo causal e dano, nos termos do disposto no artigo 186 do Código Civil de 2002.
Segundo o parecer da procuradora, para que fique caracterizada a responsabilidade do empregador, conforme tem reiterado a doutrina e a jurisprudência, é necessário que este tenha agido com culpa, ainda que leve, no acidente. Somente a ausência total de culpa do empregador o isentará da responsabilidade, ou se ficar demonstrado que o fato ocorreu por culpa exclusiva da vítima, em caso fortuito ou força maior - ou por fato exclusivo de terceiro.
‘‘Caso o transporte tivesse sido providenciado pela entidade empregadora, a vítima não se veria na contingência de depender de terceiros para chegar ao local de trabalho, e o acidente teria sido evitado’’, concluiu a procuradora em seu parecer.
Quanto ao arbitramento do valor da indenização por danos morais, o desembargador Franz ponderou que o julgador pode utilizar o salário mínimo como medida. No entanto, deve indicar ‘‘o montante da condenação em termos monetários, com algum critério de atualização, até a data do efetivo pagamento, tendo em vista a disposição expressa do inciso IV do artigo 7º da Constituição Federal, que veda a vinculação do salário mínimo, para qualquer fim’’.
Como esta vedação constitucional não foi observada pelo julgador de primeiro grau, o relator explicitou a sentença neste aspecto, ‘‘tão-somente para determinar que o cálculo deve partir do valor de R$ 93 mil, correspondente a 200 vezes o salário mínimo na data de sentença (14 de outubro de 2009)’’.
A correção monetária irá incidir também a partir data da sentença, e os juros de mora, a partir do dia do acidente. O voto do relator foi acompanhado, à unanimidade, pelos demais integrantes da 10ª Câmara Cível.
Clique aqui para ler o acórdão.


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